segunda-feira, 15 de setembro de 2025

Entre lógicas: do mundo e do Reino de Deus! (Lc 16.1-15)

 21 de setembro de 2025

Décimo quinto domingo após Pentecostes

Salmo 113; Amós 8.4-7; 1Timóteo 2.1-15; Lucas 16.1-15

Texto: Lucas 16.1 - 15

Tema: Entre lógicas: do mundo e do Reino de Deus!

 

Alex era um analista financeiro de grande sucesso. Ele geria as fortunas de seus clientes com uma eficiência impressionante. No entanto, sua vida pessoal era uma bagunça, e ele vivia em constante tensão. Sua ambição desmedida o levou a tomar algumas decisões questionáveis, e a auditoria de sua empresa descobriu que ele havia usado fundos de um cliente para cobrir uma perda pessoal.

A notícia de sua “demissão” iminente foi um choque. Ele sabia que perderia tudo: sua reputação, seu emprego e sua vida de luxo. Em desespero, Alex se lembrou das palavras de seu pai, um homem de fé simples: “A verdadeira riqueza não se mede em dinheiro, meu filho, mas nas amizades que fazemos com a generosidade”.

Com a sua saída da empresa já decidida, Alex agiu com a esperteza que o fez rico. Ele sabia que alguns de seus clientes mais antigos estavam em apuros. Um deles, um pequeno empreendedor, devia uma quantia considerável. Em vez de cobrar a dívida, Alex o procurou e disse: “Sei que sua empresa está em crise. Não se preocupe com a dívida. Esqueça-a”. O empreendedor, em choque, agradeceu a Alex, que já esperava um favor em troca. No entanto, Alex apenas sorriu e disse: “Não precisa me retribuir. Apenas use o que eu te dei para ajudar outra pessoa”.

Ele fez o mesmo com outro cliente, um fazendeiro, perdoando parte de sua dívida em trigo. Em um último ato de sua antiga vida, Alex usou o que lhe restava de poder para agir com uma generosidade inesperada. Seus colegas e a concorrência não entenderam sua atitude. Por que ele perdoou os débitos em vez de tentar recuperar o que podia?

A resposta se revelou meses depois. Alex perdeu tudo o que tinha, mas, para sua surpresa, o fazendeiro e o empreendedor, que haviam sido poupados, o procuraram. Eles não queriam pagá-lo; queriam ajudá-lo. O empreendedor lhe ofereceu uma sociedade em sua nova empresa, e o fazendeiro lhe deu parte de sua colheita para ajudá-lo a recomeçar.

Alex, que antes pensava apenas em lucros, agora entendia a verdadeira lição da parábola. Ele havia usado o que lhe restava de poder e usou a “riqueza injusta” não para se autopreservar com mais dinheiro, mas para fazer amigos para a vida. Ele havia agido com a sabedoria que o mundo usa para bens passageiros e aplicou em algo eterno: a compaixão e o serviço ao próximo.

A história de Alex nos lembra que a verdadeira esperteza não está em acumular, mas em liberar. É usar os recursos passageiros deste mundo para construir relacionamentos.

A parábola do Administrador Infiel (Lucas 16.1-15) é um dos textos mais complexos do Novo Testamento, e por isso, não se pode ficar preso a uma interpretação simplista ou moralista. Essa parábola não é um elogio à desonestidade, mas um contraste radical entre a lógica do mundo e a lógica do Reino de Deus.

O administrador, ao ser confrontado com a iminente perda de seu cargo, age com astúcia para garantir seu futuro material. Passa a usar o que lhe resta de poder para fazer “amigos” em troca de favores. Essa situação, na verdade, representa a humanidade diante da Lei de Deus. Ao ser confrontado com a sua própria falência, destacado pela incapacidade de cumprir a vontade divina, o pecador precisa encontrar uma solução.

O administrador age com esperteza (phronesis). Contudo, essa astúcia é voltada para o “reino deste mundo”. O administrador usa a riqueza injusta para fazer amigos e assegurar seu futuro. Por essa razão, Jesus convida a refletir: se as pessoas deste mundo são tão sagazes para garantir seu futuro material, quanto mais os cristãos deveriam ser, mas em relação às coisas espirituais!

A “esperteza” cristã não é uma astúcia moral. É a sabedoria de se desapegar das riquezas. A parábola não condena o dinheiro em si, mas o chama de “Mamom da injustiça”, ou seja, uma força perigosa que tem o poder de desviar o coração humano de Deus. Usar o dinheiro para fazer “amigos” significa reconhecer que toda riqueza pertence a Deus e que a única forma de redimi-la é usá-la para o serviço ao próximo.

Um ponto nevrálgico nessa parábola é que enfatiza que a salvação não se dá pelas boas obras. Afinal, a astúcia do administrador, no final das contas, o justifica apenas diante dos homens. A verdadeira salvação não vem da gestão habilidosa de bens, mas da total dependência da misericórdia de Deus. O administrador, ao ser despojado de tudo, é um tipo daquele que, ao ser despojado da própria justiça, se apega à graça de Deus.

A conclusão da parábola traz um estridente clímax: “não se pode servir a Deus e ao dinheiro”. O dinheiro não é apenas um objeto, mas um senhor rival de Deus. A pessoa que confia na riqueza para sua segurança material ou espiritual (através de boas obras) serve ao dinheiro. A liberdade cristã, portanto, está em reconhecer Deus como o único Senhor e usar tudo, inclusive a riqueza, como simples instrumento para o serviço, sem jamais lhes dar o status de salvador.

Lucas 16.1-15 é tal como um espelho que revela o nosso estado de pecado e a nossa inclinação para a autopreservação. Enquanto o administrador busca a salvação terrena pela esperteza, o cristão verdadeiro entende que não há salvação em si mesmo, nem em suas posses.

A parábola é um convite para que larguemos a confiança nas riquezas e nas próprias obras, e nos apegamos à salvação gratuita que vem pela fé em Cristo. A moral da história não é “seja esperto como o administrador”, mas, reconheça sua falência e assim, confie na graça de Deus, usando o que o mundo te oferece para servir ao próximo e demonstrar que você não é mais escravo do dinheiro. Amém

Edson Ronaldo Tressmann

Deus, os olhos dos oprimidos! (Am 8.4-7)

 21 de setembro de 2025

Décimo quinto domingo após Pentecostes

Salmo 113; Amós 8.4-7; 1Timóteo 2.1-15; Lucas 16.1-15

Texto: Amós 8.4-7

Tema: Deus, os olhos dos oprimidos!

 

O profeta Amós, em um tempo de aparente prosperidade e rituais religiosos, denunciava a dura realidade da injustiça social e da exploração. Em Amós, especificamente Amós 8.4-7, a mensagem é direta e chocante: Deus condena veementemente àqueles que, em nome do lucro, oprimem os mais vulneráveis.

Essa passagem é assustadoramente atual. Os versículos mostram uma mentalidade que, embora antiga, semelhante ao que acompanhamos em nossos dias: a ganância que transforma tradições e celebrações religiosas e dias de descanso em obstáculos para os negócios.

Os supostos religiosos da época do profeta Amós estavam mais ansiosos pelo fim das celebrações para voltar à prática de seus negócios do que em participar das festas religiosas.

A ganância era tão grande que o desejo era ver os pobres endividados e, por fim, por um “um par de sandálias” (Am 8.6) se tornarem escravos. No intento de alcançar esse objetivo, os comerciantes usavam “pesos e medidas falsas” (Am 8.5) vendendo “trigo que não presta” (Am 8.6).

Ante a essa exploração, a resposta de Deus é clara e severa. Deus se coloca na posição de defensor dos oprimidos e faz um juramento: “Nunca esquecerei aquilo que o meu povo tem feito” (Am 8.7). Esse juramento não é uma simples ameaça; é a manifestação da própria justiça de Deus e Deus, que é justo, não ignora a dor dos que sofrem. Ele é, de fato, os olhos dos oprimidos.

A mensagem de Amós, anunciada há milhares de anos, continua relevante, desafiando-nos a examinar nossas atitudes e a realidade ao nosso redor. Acompanhamos aterrados o usa de “pesos e medidas falsas” (Am 8.5) de uma forma ainda mais sofisticada. Noticiários mostram carros de luxo, relógios sofisticados, coleção de obras de arte, e tudo isso com o peso e a medida falsa de fraudes e roubo, através de descontos de aposentadorias de trabalhadores. A ganância e a exploração corrompem não apenas a sociedade, mas também a alma do indivíduo (Lutero). Os ladrões de hoje usam roupas finas e roubam sem armas, explorando os que já estão de mãos vazias.

Amós dirigia sua mensagem para pessoas que, embora observassem os ritos religiosos, tinham seus corações distantes de Deus. A religiosidade era apenas uma fachada para acobertar a prática da injustiça.

O profeta nos ensina que a fé verdadeira se manifesta em ações de justiça e compaixão. A exploração descrita em Amós é a evidência de uma fé morta, de um coração que ainda está preso à escravidão do pecado e do dinheiro.

Deus vê e se importa com as injustiças. Deus, os olhos dos oprimidos! Por menores que pareçam aos olhos humanos, cada injustiça tem Deus como defensor e juiz dos opressores.

O texto de Amós 8.4-7 é um convite para reflexão profunda sobre nosso papel na sociedade. Sou instrumento de justiça e compaixão ou estou contribuindo para exploração e opressão?

Em tempos de evangelho da glória e prosperidade, muitas pessoas estão vivendo numa ilusão religiosa. Muitos religiosos classificam a riqueza, a prosperidade, os bens, as posses, como um sinal de bênção de Deus ante sua fidelidade. Pessoas estão em busca da retribuição divina, por isso, pobres lotam igrejas, fazem das “tripas coração” para alcançar uma vida econômica melhor. E, muitos iludidos por uma falsa retribuição divina acabam se tornando exploradores usando um suposto escudo da fé.

Líderes religiosos e leigos religiosos, quando a prosperidade não vem, quando a riqueza não surge, aceitam a culpa de uma infidelidade para com Deus ou até mesmo um pecado cometido. A teologia da glória e da prosperidade disseminou e dissemina uma mentira que aos poucos se torna uma verdade: quando alguém não prospera ou perde o que possui, ou é uma pessoa sem fé ou está pagando por algum pecado cometido.

Caríssimos irmãos, o sistema social e econômico, é insuportável e desonestamente está levando muitas pessoas ao endividamento e até a escravidão moderna.

O texto de Amós 8.4-7 é um flagrante desrespeito à lei de Deus e a justiça social. Infelizmente, ainda se usa pesos e medidas falsas e se vende produtos de má qualidade como sendo de boa qualidade.

A fé verdadeira não é um mero cumprimento de rituais, mas, uma transformação interior que se manifesta em boas obras. A verdadeira fé, a sola fide, não anula a necessidade de boas obras; ao contrário, a fé é a fonte dessas boas obras que coloca o próximo em primeiro lugar. A exploração descrita em Amós 8.4-7 é a evidência de uma fé morta, de um coração que ainda está preso à escravidão do pecado e do dinheiro.

Amós 8.4-7, além da injustiça, ataca o anseio que os comerciantes tinham quanto a opressão, advinda da ganância. A própria Palavra de Deus transmite que o amor ao dinheiro é capaz de corromper tudo, até a fé (1Tm 6.10).

Precisamos recordar que Deus anseia por justiça e essa justiça ansiada por Deus não está em nós mesmos. A nossa justiça está em Cristo. Jesus Cristo me coloca numa nova relação com Deus e com o próximo, em Cristo eu busco cada vez melhorar minha justiça com meu próximo.

Deus, os olhos dos oprimidos! Ele conhece nossa situação a luz da natureza pecaminosa e para nossa salvação enviou Jesus Cristo. Amém

Edson Ronaldo Tressmann

terça-feira, 9 de setembro de 2025

Um Deus que busca e encontra! (Lc 15.1-10)

 14 de setembro de 2025

Décimo quarto domingo após Pentecostes

Salmo 119.169-176; Ezequiel 34.11-24; 1Timóteo 1.12-17; Lucas 15.1-10

Texto: Lucas 15.1-10

Tema: Um Deus que busca e encontra!

 

Introdução

Em nosso mundo, o valor de algo é muitas vezes medido por sua utilidade, por sua raridade ou por sua quantidade. Uma única ovelha, de um rebanho de cem, parece insignificante. Se você perguntasse para um empresário: você pararia toda a sua produção para procurar uma única peça que vale muito pouco? A resposta provavelmente seria não. É a economia da maioria.

A parábola de Jesus vira essa lógica de cabeça para baixo. Jesus não se preocupa com a matemática da maioria; Jesus se preocupa com a matemática do amor. Ele nos ensina que, aos olhos de Deus, o valor de cada indivíduo é tão grande que Ele está disposto a deixar o que é “seguro” para ir atrás do que é “perdido”. O foco não é as 99 ovelhas que estão no curral, seguras, mas naquela que se perdeu. Dessa forma, vamos refletir no motivo dessa ovelha ser tão preciosa e sobre o coração do Bom Pastor Jesus.

Parte 1

A passagem é uma defesa de Jesus contra a crítica dos fariseus e escribas.

É preciso destacar a importância do verbo grego aproximavam-se” (ἐγγίζοντες). Jesus nota que a multidão de publicanos e pecadores estava ativamente buscando Jesus. Isso é um contraponto direto à atitude de desprezo dos fariseus e escribas. A palavra, murmuravam (διεγόγγυζον), implica num murmúrio contínuo e interno de desaprovação.

A crítica dos fariseus (“este recebe pecadores e come com eles”) é a chave para entender as duas parábolas que se seguem. Jesus não está apenas contando histórias, está se justificando suas ações.

O verbo grego “perdeu” é ἀπολέσας e ressalta que essa “perda” é real e que a ovelha perdida não está apenas temporariamente ausente; ela está em perigo mortal.

O número 100 não é literal; é uma imagem de totalidade. O pastor, ao deixar as 99 ovelhas para buscar a que se perdeu, demonstra a alta prioridade que Deus dá a cada indivíduo. A ovelha perdida, aos olhos do pastor, não é menos valiosa do que as 99.

O verbo grego para “procura” é ζητέω e significa uma busca diligente e persistente. O pastor a busca até encontrar. Essa busca representa o ministério de Jesus em relação aos pecadores.

A parábola culmina com a alegria (χαρὰν) no céu. A alegria de Deus por um único pecador que se arrepende é maior do que a alegria pelos “noventa e nove justos que não necessitam de arrependimento”. Ele interpreta os “justos” como as pessoas que, como os fariseus, se consideravam justas e não viam a necessidade de se arrepender. A ironia é que a parábola não elogia os “justos”, mas sublinha o valor do pecador arrependido.

A segunda parábola (Lc 15.8-10) é um complemento da primeira, mas com algumas diferenças significativas: a mulher, ao procurar sua moeda, simboliza a busca de Deus pela alma perdida. A moeda, ao contrário da ovelha, não pode se mover e está “perdida” por inatividade, o que pode representar pessoas que estão espiritualmente perdidas, mas não ativamente rebeldes.

O número 10, assim como o 100, é simbólico. Indica a totalidade das posses. A mulher se esforça ao máximo, acendendo uma lâmpada e varrendo a casa, para encontrar a moeda, mostrando o quão valiosa cada alma é para Deus.

A alegria da mulher, de suas amigas e vizinhas, representa a alegria (χαρὰν) dos anjos no céu por um pecador que se arrepende.

Parte 2

A alegria mencionada nas parábolas não é pelo pecador em si, mas pelo arrependimento (metanoia).

O arrependimento é a resposta humana à busca divina. Ele não é uma obra que se faz para ganhar a salvação, mas a fé que se manifesta na volta para Deus. A alegria no céu é a celebração do dom da salvação que é recebido pelo pecador arrependido.

O propósito das parábolas é revelar o coração de Deus. Ele não é um juiz distante que apenas condena, mas um Pai Amoroso que busca o filho perdido. As parábolas são um convite para os fariseus e para todos que se consideram justos para reconhecerem sua própria necessidade de arrependimento e a se unirem à alegria do céu.

As parábolas em si são a manifestação do Evangelho. Elas revelam que Deus age de forma contrária à lógica da Lei e à justiça humana. A ovelha e a moeda perdida representam os pecadores que, por natureza, estão separados de Deus. A iniciativa de busca pertence unicamente a Deus. O pastor busca a ovelha e a mulher procura a moeda. Isso sublinha que a salvação não é o resultado da busca humana por Deus, mas sim da busca incansável de Deus pelo pecador.

Para Deus, cada indivíduo perdido tem um valor incalculável. A lógica humana, que daria preferência aos noventa e nove, é subvertida pela lógica do amor de Deus. A ovelha perdida e a moeda perdida são os objetos da graça divina. Amém

Edson Ronaldo Tressmann

segunda-feira, 8 de setembro de 2025

Salvação é por graça! (1Tm 1.15)

 14 de setembro de 2025

Décimo quarto domingo após Pentecostes

Salmo 119.169-176; Ezequiel 34.11-24; 1Timóteo 1.12-17; Lucas 15.1-10

Texto: 1Tm 1.12-17

Tema: Salvação é por graça!

 

O ensinamento verdadeiro e que deve ser crido e aceito de todo o coração é este: Cristo Jesus veio ao mundo para salvar os pecadores, dos quais eu sou o pior” (1Tm 1.15).

 

Ensinamento verdadeiro” (πιστὸς ὁ λόγος) é uma expressão de Paulo usada várias vezes nas epístolas pastorais (1Tm 3.1; 4.9; 2Tm 2.11; Tt 3.8). Ela serve para introduzir uma declaração de suma importância e autoridade, um ditado que já era possivelmente bem conhecido nas primeiras comunidades cristãs. O termo indica que o que está sendo dito é digno de total confiança e crença.

Cristo Jesus veio ao mundo para salvar os pecadores” é a essência do Evangelho. Paulo não está apresentando uma ideia nova, mas sim a base da fé cristã. A vinda de Cristo tem um propósito claro e singular: salvar. O objeto de sua salvação são os pecadores, e não os justos ou os que se consideram dignos.

dos quais eu sou o pior” (ὧν πρῶτος ἐγώ εἰμι) é a parte mais poderosa da afirmação de Paulo. Ele se coloca no topo da lista dos pecadores. A palavra grega prōtos significa “o primeiro”, “o principal” ou “o pior”. Ao invés de se gabar de seu apostolado, Paulo se humilha, lembrando de seu passado como perseguidor e blasfemador (1Tm 1.13). Essa confissão de sua própria pecaminosidade radical serve a dois propósitos:

Credibilidade: sua própria vida é a prova viva da verdade que ele prega. Se Cristo pode salvar o “pior dos pecadores” como ele, então a salvação é realmente para todos.

Exemplo: A atitude de Paulo serve de modelo para todos os crentes, mostrando que a salvação não se baseia em méritos, mas na graça imerecida de Deus.

A confissão de Paulo: “dos quais eu sou o pior” não é apenas uma demonstração de humildade, mas um pilar da teologia cristã. Ela desmascara a ideia de que a salvação é uma recompensa por méritos. Se a salvação fosse por obras, um homem como Paulo, com seu passado de perseguição e violência contra a igreja, jamais poderia ser salvo. Ao se colocar como o maior dos pecadores, ele não está apenas se humilhando; ele está elevando a graça de Cristo a um patamar inalcançável por qualquer esforço humano.

A lógica humana sugere que Deus escolheria e escolhe os mais justos, os mais puros. A escolha de Paulo, e sua subsequente confissão, mostra que a graça divina transcende a lógica e a justiça humanas. Deus salva não porque o pecador merece, mas porque Ele é misericordioso.

A confissão de Paulo torna o Evangelho acessível a todos. Se um homem que perseguiu e blasfemou pode ser salvo, então a salvação é possível para o viciado, para o arrogante, para o traidor, e para qualquer pessoa que se sinta indigna. A humildade de Paulo se torna um convite para que todos os pecadores se identifiquem com ele e se voltem para a mesma fonte de misericórdia.

Quem escreveu? Para quem e por quê foi escrita essa carta? Qual era a situação da época?

A carta foi escrita por Paulo a Timóteo. Timóteo era um jovem líder que Paulo deixou em Éfeso para supervisionar a igreja.

A Primeira Epístola a Timóteo é uma das “epístolas pastorais” (junto com 2 Timóteo e Tito). O propósito principal é instruir Timóteo sobre como liderar a igreja, combater falsos ensinamentos, organizar a vida eclesiástica e manter a doutrina correta.

O contexto imediato de 1Timóteo 1.15 é o combate às falsas doutrinas (1Tm 1.3-4). Paulo argumenta contra aqueles que se desviavam do “verdadeiro propósito da Lei” (1Tm 1.5-11), que é expor o pecado. O versículo 15, portanto, é a antítese a esses falsos ensinamentos. Enquanto eles se perdiam em genealogias e “fábulas” (1Tm 1.4), Paulo reafirma a centralidade da mensagem de salvação. Ele prova a verdade do Evangelho com sua própria vida, que é um testemunho da graça de Deus que perdoa os maiores pecadores.

No contexto da igreja de Éfeso, os falsos mestres provavelmente se consideravam mais “espirituais” ou “conhecedores” do que os outros. A mensagem de Paulo é um antídoto direto a essa presunção.

Paulo argumenta que o propósito da Lei é nos mostrar o pecado. Quando alguém tenta viver apenas pela Lei, o resultado é a justiça própria. Essas pessoas se tornam cegas para suas próprias falhas e acabam se perdendo em detalhes secundários (como “fábulas e genealogias”). O versículo 15, em contraste, força o leitor a reconhecer a verdadeira condição humana: somos todos pecadores.

O apóstolo Paulo não está apenas refutando um argumento; ele está oferecendo o caminho da vida. Em vez de uma vida de constante esforço para provar a si mesmo, ele propõe uma vida de confiança e descanso na obra completa de Cristo. A salvação vem pela confiança em Cristo, e não pelo desempenho de obras, por mais nobres que pareçam.

Como este texto se aplica a nós hoje?

O versículo 15 nos desafia a adotar a mesma atitude de Paulo. Em vez de nos compararmos com os outros e nos considerarmos “melhores”, devemos nos reconhecer como pecadores diante de Deus. A salvação não é para aqueles que se consideram dignos, mas para os que, como Paulo, reconhecem sua necessidade desesperada de um Salvador.

A declaração de Paulo de que ele é o “pior dos pecadores” é uma prova poderosa de que a salvação de Cristo é para todos. Ninguém está além do alcance da graça de Deus, não importa quão grande seja o seu pecado. Isso nos encoraja a compartilhar o Evangelho sem medo, sabendo que a salvação de Cristo é suficiente para qualquer um.

O ponto principal do texto é a mensagem cristã sobre Cristo Jesus. Ele é o centro, a razão, o meio e o propósito de toda a nossa fé. O nosso foco não deve estar nas nossas obras, na nossa moralidade ou na nossa justiça própria, mas unicamente na pessoa e na obra de Cristo.

Em resumo, 1Timóteo 1.15 é um dos versículos mais importantes do Novo Testamento. Pois, resume a essência da fé cristã: a salvação é para os pecadores, a graça é demonstrada no perdão do pior deles e a única razão para a nossa esperança é Cristo.

Em um mundo que valoriza a perfeição e o sucesso, é fácil cair na armadilha de fingir que somos mais justos do que somos. A confissão de Paulo nos encoraja a sermos autênticos, a reconhecer nossas fraquezas e a encontrar nossa identidade não em nosso desempenho, mas na graça de Cristo.

Quando reconhecemos que somos tão pecadores quanto qualquer outra pessoa, nossa atitude para com os outros muda. Em vez de julgar, somos levados à compaixão e ao amor. O Evangelho que nos salvou é o mesmo que pode salvar os outros.

A igreja moderna muitas vezes se perde em debates secundários, desviando-se da mensagem principal. Paulo nos lembra que a tarefa central da igreja é proclamar o Evangelho: “Cristo Jesus veio ao mundo para salvar os pecadores”. Esta é a mensagem que transforma vidas e dá esperança.

 

Edson Ronaldo Tressmann

domingo, 7 de setembro de 2025

Em caso de desorientação: a ovelha perdida e a esperança de retorno!

 14 de setembro de 2025

Décimo quarto domingo após Pentecostes

Salmo 119.169-176; Ezequiel 34.11-24; 1Timóteo 1.12-17; Lucas 15.1-10

Texto: Salmo 119.176

Tema: Em caso de desorientação: a ovelha perdida e a esperança de retorno!

 

Como ovelha perdida, tenho andado sem rumo. Ó Senhor Deus, vem buscar este teu servo, pois não esqueço os teus mandamentos!” (Sl 119.176)

 

Essa passagem expressa a profunda sensação de estar perdido, de ter se desviado do caminho, mas, ao mesmo tempo, de manter viva a lembrança da Palavra de Deus e o desejo sincero de retornar à sua presença. É a oração de alguém que, mesmo na angústia, sabe que sua verdadeira casa e seu verdadeiro Pastor estão com Deus.

Essas palavras nos remetem à conhecida Parábola da Ovelha Perdida, contada por Jesus em Lucas 15.3-7 e Mateus 18.12-14. Jesus usou essa história para ilustrar o cuidado e a alegria de Deus por cada pessoa que se perde, mas é encontrada. Ele não quer que ninguém se perca e se alegra imensamente ao resgatar uma vida que se desviou.

A imagem do pastor que deixa noventa e nove ovelhas para buscar uma única perdida nos mostra que, para Deus, cada um de nós é inestimável. A busca do pastor não é uma cobrança, mas um ato puro de amor e de resgate.

No Salmo 119, o maior da Bíblia, cada verso é um louvor à Palavra de Deus. A última estrofe, que contém o versículo 176, combina um lamento de angústia com uma declaração de fé e esperança.

Quando o salmista se descreve como uma “ovelha perdida”, ele usa uma metáfora reflexiva. Ovelhas são animais vulneráveis, facilmente desorientados, que não conseguem encontrar o caminho de volta sozinhas. Ao reconhecer-se assim, o salmista mostra sua total dependência e fragilidade. O termo hebraico para “perdido” descreve alguém que está alienado, desconectado e sem rumo.

Seu pedido, “vem buscar o teu servo”, não é uma exigência, mas um ato de humildade e entrega. O salmista reconhece que a iniciativa do resgate pertence a Deus. Ele se coloca em sua verdadeira identidade, a de servo de Deus, alguém que pertence a Ele e confia que o Pastor virá em seu socorro.

A frase “pois não me esqueci dos teus mandamentos” não é uma justificativa para o resgate, mas um sinal de esperança. Ela mostra que, mesmo em meio ao desvio, a lei de Deus permanece em seu coração. A Palavra não é apenas um conjunto de regras, mas a voz de Deus que nos chama de volta.

Lembrar-se dos mandamentos, mesmo no erro, é um sinal de que o Espírito de Deus ainda está agindo. Assim como o Filho Pródigo, que se lembrou da bondade do seu pai, a lembrança da Lei de Deus nos dá a esperança de que existe um caminho de volta e que a salvação depende não da nossa perfeição, mas da graça de Deus em nos buscar.

A Lei de Deus, mostra o estado de “ovelha perdida”. A consciência que nos fala de acordo com a Lei de Deus nos faz ver o quanto “tenho andado sem rumo” (Sl 119.176). Diante disso, a oração: “Ó Senhor Deus, vem buscar este teu servo” (Sl 119.176) é a expressão de fé naquele que vem ao encontro para restaurar a caminhada.

O salmista reconhece-se pecador e confia inabalavelmente na graça de Deus.

As palavras: “Ando errante como ovelha perdida; vem buscar o teu servo, pois não me esqueci dos teus mandamentos” (Sl 119.176) são de alguém que deseja ser resgatado.

A riqueza teológica e espiritual dessa última estrofe desse Salmo 119 reside na combinação de um lamento de angústia com uma declaração de fé e esperança.

No seu contexto original é preciso destacar que esse é o maior salmo da Bíblia. Todos os 176 versículos visam entoar um hino de louvor a lei de Deus descrita como mandamentos, estatutos, preceitos e testemunho.

A metáfora “Como ovelha perdida, tenho andado sem rumo” (Sl 119.176) no mundo antigo era extremamente poderosa.

Ovelhas são animais que facilmente se perdem, são extremamente vulneráveis, pois dependem de alguém que as guie. Perdida, uma ovelha, não consegue encontrar o caminho de volta sozinha.

Nesse contexto, o salmista se diz se vulnerável e desorientado.

O termo hebraico que descreve perdido significa alguém desviado do caminho, é alguém desorientado, fragilizado e alienado. Está desconectado e perdido no mundo.

O pedido para que seja buscado indica que por si só, não pode encontrar o caminho de volta. Precisa ser buscado e levado de volta.

Ao se dizer como servo o salmista reforça sua identidade e vínculo com Deus. Ele sabe que é de Deus, pertence a Deus.

A frase: “pois não esqueço os teus mandamentos” não é uma chantagem. É um sinal de esperança, por saber quem é esse Deus. Diz que mesmo que sua vida seja errante, a lei de Deus está em seu coração e por isso, não é um perdido por completo.

Em algum momento da vida você se sentiu desorientado?

Temos crises de fé, momentos de angústia, em alguns momentos o caminho de Deus é distante e confuso. Essa breve oração (Sl 119.169-176) nos dá palavras para falar com Deus sobre a nossa fragilidade.

A imagem da ovelha perdida encontra sua plena realização no Bom Pastor Jesus Cristo. Quando ouvimos na leitura de Lucas 15, Jesus contando a Parábola da Ovelha Perdida, Ele nos revela que Deus é o Pastor que ativamente busca o que se perdeu. Dessa forma, podemos também refletir que o clamor do salmista “vem buscar este teu servo” é o que Deus, em Cristo, veio fazer por nós. Ele é a resposta divina ao nosso clamor de busca e socorro.

O fato de o salmista não se esquecer dos mandamentos sublinha a importância da Palavra de Deus em nossa vida. A Palavra não é apenas um conjunto de regras, mas a voz de Deus que nos chama de volta quando nos desviamos. Mesmo quando o coração está confuso, a lembrança da Palavra nos dá a esperança de que existe um caminho de volta.

O consolo que este texto nos traz ensina que a nossa salvação não depende de quão bem “andamos” ou de quão “não errantes” somos. Dependemos da ação graciosa de Deus em nos buscar. O salmista não foi resgatado porque era perfeito.

Somos lembrados por essa oração do salmista que, mesmo em nossa condição mais vulnerável e desorientada, a nossa fé se manifesta não na nossa capacidade de encontrar o caminho, mas na nossa súplica a Deus para que Ele nos encontre no nosso caminho. Amém

 

Edson Ronaldo Tressmann

sexta-feira, 5 de setembro de 2025

Um discípulo vive pela graça!

 07 de setembro de 2025

Décimo Terceiro Domingo após Pentecostes

Salmo 1; Deuteronômio 30.15-20; Filemon 1-21; Lucas 14.25-35

Texto: Lucas 14.25-35

Tema: Um discípulo vive pela graça!

 

Parte 1

O texto inicia enumerando que uma grande multidão estava acompanhando Jesus (Lc 14.25).

A maioria dos exegetas e comentaristas bíblicos enfatizam que as palavras ditas por Jesus, visa apenas contrastar a multidão. Afinal, há seguidores e há discípulos.

Você é um seguidor de Cristo ou é um discípulo? Há diferença entre ser um seguidor e ser um discípulo?

Espero que através dessa reflexão, possamos compreender que há diferença e muitas vezes é bem o oposto daquilo que tanto ouvimos.

Muitos daquela multidão seguiam Jesus por mero interesse. Jesus já era acompanhado e seguido por causa dos muitos milagres que havia realizado. Mas, e quando surgisse a perseguição, a calúnia pelo fato de ser cristão, o ódio do mundo?

Na parábola anterior ao nosso texto, ao contar sobre o convite que Deus faz para àqueles que não podem se justificar Jesus disse: “...eu afirmo a vocês que nenhum dos que foram convidados provará o meu jantar!” (Lc 14.24). Qual é a razão dessas palavras? Nosso texto ajudará a compreender isso.

Enquanto os fariseus e demais religiosos estavam engajados em cumprir a Lei divina e assim se colocarem como maiores que os demais, Jesus, ao falar sobre o significado do discipulado destaca pela palavra grega μισέω (miséo) odiar, que nada pode ultrapassar a devoção a Cristo Jesus. O amor a Jesus e a devoção a ele precisa ser tanta a ponto de todos os demais relacionamentos parecerem ódio delas. Quer dizer, “abro mão” de qualquer coisa, menos do relacionamento com Jesus Cristo. Jesus é a minha prioridade total. O discípulo de Jesus o segue até a morte, “carrega sua cruz”. Passa por perseguição, calúnia, desamores, ... esse é o custo calculado (Lc 14.28).

O discípulo é tal como o rei que vai a guerra sem ter forças necessárias (Lc 14.31). Sua vida diária é marcada pelo conflito espiritual (Ef 6.10-20). A única maneira de vencer é estar em Cristo, esse é o significado da palavra “acordo de paz” (Lc 14.32).

Ao enumerar sobre o sal que perde o sabor (“perder o sabor” “μωραίνω, moraíno) pode significar “tornar-se tolo”. Isso significa uma crítica direta as pessoas que o seguiam, mas estavam comprometidos com Jesus Cristo por conveniência. Essa atitude é, em última análise, uma tolice. O sal que perde o sabor é a representação de uma fé superficial, interesseira.

Parte 2

Lucas 14.25-35 é um dos trechos mais desconfortáveis de todo o Evangelho. São palavras que escancaram a impossibilidade de cumprir as exigências da Lei de Deus que exige prioridade absoluta. A lei de Deus exige uma lealdade a Jesus Cristo que supera todas as outras.

Os versículos 26 a 33 são a Lei de Deus em sua forma mais pura e exigente. A mensagem é inegavelmente clara.

O versículo 26, onde Jesus exige um amor que “odeie” o pai, a mãe e até a si mesmo por causa de Jesus, é interpretada como a Lei de Deus sobre o Primeiro Mandamento. A Lei de Deus exige um compromisso total e absoluto com Deus. Se nossa lealdade a família, bens, ou a própria vida, compete com a lealdade a Cristo, estamos violando a Lei de Deus. Observe que a exigência é tão alta que, por natureza, ninguém pode cumpri-la.

Os versículos 27 a 33 sobre carregar a cruz, construir a torre e o rei em guerra, são exemplos práticos da Lei de Deus. Jesus argumenta sobre a impossibilidade humana de seguir todas as exigências que a Lei de Deus exige. A Lei exige o sacrifício de tudo, uma entrega total que, por nossas próprias forças, somos incapazes de dar. O propósito dessas parábolas é enfatizar que o discipulado é impossível sem a graça de Deus.

Ao pronunciar palavras que destacam o quanto somos incapazes para cumprir com as exigências da Lei de Deus, Jesus quebra o orgulho e a autossuficiência, mostrando que nada nos é possível realizar por conta própria.

Após ouvir essas exigências impossíveis, o ouvinte é levado a reconhecer que falhou. Ninguém pode amar a Jesus perfeitamente ou carregar a cruz sem vacilar. O resultado é o reconhecimento do próprio pecado e da incapacidade. Por essa razão somos convidados a louvar a Deus, afinal, recebemos a salvação não pelo nosso cumprimento da Lei, mas pelo cumprimento perfeito de Jesus em nosso lugar. Ele amou a Deus perfeitamente e carregou a cruz por nós.

O sal é uma estrutura química sólida (cloreto de sódioNaCl), e mesmo com toda tecnologia de produção atual, quando exposto ao sol, água, umidade, ou até mesmo ao ar, perde suas propriedades e pode se tornar insípido.

A parábola do sal sem gosto quer destacar a perda de salinidade do cristão. E isso ocorre quando o cristão tenta seguir a Cristo por suas próprias forças, sem reconhecer sua incapacidade e sem se apoiar na graça de Deus. Uma vida de mera formalidade, sem fé e sem o alimento do Evangelho é inútil e sem propósito. Sem a fé e sem o evangelho perde-se a salinidade, ou seja, deixa-se de preservar e dar sabor ao mundo.

Lucas 14 é um lembrete do início ao fim de que a Lei de Deus confronta nossas falhas e a Lei de Deus exige um padrão inatingível. Nesse sentido, os episódios narrados em Lucas 14 enfatizam que a salvação não se compra, é proveniente da graça de Deus em Jesus Cristo.

Jesus carregou a cruz! Jesus me convida para segui-lo. Jesus inicia e completa a fé. Jesus cumpriu a Lei em meu lugar.

Lucas 14.25-35 é um ataque direto à crença de que os atos humanos podem garantir a salvação. A única coisa que realmente salva é a graça de Deus por meio da fé em Cristo. Um seguidor pensa em si mesmo. Um discípulo vive na e pela graça. Amém

Edson Ronaldo Tressmann

quarta-feira, 3 de setembro de 2025

A vida está em Jesus Cristo (Dt 30.15-20)

 07 de setembro de 2025

Décimo Terceiro Domingo após Pentecostes

Salmo 1; Deuteronômio 30.15-20; Filemon 1-21; Lucas 14.25-35

Texto: Deuteronômio 30.15-20

Tema: A vida está em Jesus Cristo!

 

Todos os dias, nos deparamos com encruzilhadas. Algumas são pequenas, como a escolha do que vestir ou o que comer. Outras são enormes, como a decisão de um casamento, uma mudança de carreira, ou a maneira como vamos educar os filhos. A vida é moldada por escolhas. Cada escolha traz consequências. Há caminhos que levam à alegria e à realização, e há caminhos que nos levam à dor e ao arrependimento.

Falando em escolhas, Deuteronômio 30.15-20 parece trazer uma escolha e suas consequências. E para que possamos compreender esse texto, debruçaremos sobre o mesmo.

Parte 1

Deuteronômio 30.15-20 segue um padrão de três passos:

Primeiro passo: o texto precisa ser lido como Lei de Deus. Lei que condena o pecador e revela sua impotência;

Segundo passo: o texto aponta para a necessidade de um Salvador;

Terceiro passo: Esse texto é cumprido em Jesus Cristo, não atoa, durante o ministério de Jesus, o livro de Deuteronômio é o que Jesus mais cita.

O apostolo Paulo, na carta aos Romanos (Rm 10.5-8) faz uma referência direta a Deuteronômio 30. Todavia, sua interpretação é cristológica. O apostolo contrasta a “justiça que é da lei” (baseada na obediência) e a “justiça da fé” (em Jesus Cristo). Nesse contraste, o apostolo Paulo destaca que aquilo que a lei exigia pela obediência perfeita, o Evangelho oferece gratuitamente pela fé em Jesus Cristo que cumpriu a Lei.

Aos Romanos, citando Deuteronômio 30.15-20, o apostolo argumenta que a justiça diante de Deus não depende do esforço humano, essa justiça nos é dada e oferecida por Cristo.

Na conversa com o jovem rico sobre a vida eterna (Mt 19.16-17), Jesus remete o diálogo ao princípio de Deuteronômio 30: “...Se você quer entrar na vida eterna, guarde os mandamentos” (Mt 19.17), e com eco das palavras: “se você fizer isto, terá a vida” (Dt 30.16), Jesus convida àquele jovem rico ao desespero da impossibilidade de cumprir perfeitamente a Lei de Deus.

O fato é que, àquele jovem apegado a Lei, a letra, ao ver sua falha em não amar o próximo, saiu triste.

Ao escrever a carta aos Gálatas, o apóstolo Paulo contrasta a Lei e a Graça. Em outras palavras, Paulo usa como pano de fundo Deuteronômio 30.15-20. Na carta aos Gálatas, o apostolo enfatiza a tese de que a salvação não pode ser conquistada pelas obras da Lei. A promessa da vida é cumprida em Cristo e não por meio da nossa capacidade de “escolher a vida” e obedecer perfeitamente.

Parte 2

Deuteronômio 30.15-20 é uma passagem que contêm uma declaração teológica fundamental que revela a incapacidade humana de alcançar a salvação por meio de suas próprias obras e aponta para a necessidade de um Salvador.

A escolha entre “vida e bem” e “morte e mal” como uma exposição da função mais profunda da Lei de Deus. A Lei não é apenas um guia para a vida, mas um espelho que reflete o pecado humano.

A Lei, com sua exigência de obediência perfeita, é impossível de ser cumprida pelo ser humano pecador. A promessa de “vida” em Deuteronômio serve para mostrar que a humanidade não pode alcançar por si mesma. A Lei condena e, ao fazer isso, leva o pecador ao desespero e ao reconhecimento de que ele precisa de um Salvador.

Temos aqui a função pedagógica da Lei. Ela nos educa sobre a nossa condição caída e nos leva a buscar a graça divina. A “vida” prometida no texto não é algo que o ser humano pode “escolher” por seu próprio poder, mas é um dom que deve ser buscado em Deus e só é encontrado em Jesus Cristo que cumpriu a Lei.

Em contraste com a Lei, que condena, o Evangelho anuncia a salvação. Por isso, Deuteronômio 30.15-20 só pode ser interpretado à luz de Cristo.

A vida e o bem não são conquistados por “amar ao Senhor” e “andar em seus caminhos” através do esforço humano, mas são recebidos gratuitamente por meio da fé em Jesus Cristo. Cristo é aquele que cumpriu perfeitamente toda a Lei e sofreu a punição por nossa desobediência.

A “escolha” em Deuteronômio não é uma escolha pela nossa capacidade, mas é um convite para se apegar a Deus, que é a própria vida e nos concede a mesma em Jesus. O verbo hebraico dabaq (“apegar-se”), sugere uma união íntima. E este apegar-se é visto como uma metáfora para a fé em Cristo, que nos une a Ele. Pois a fé são os braços agarrados em Jesus.

A obediência do cristão não é uma tentativa de ganhar o favor de Deus. Em vez disso, é um fruto da fé e uma resposta de gratidão à salvação que já foi recebida. Uma vez que o cristão é justificado pela fé, ele é capacitado pelo Espírito Santo a viver uma vida que agrada a Deus. A obediência à Lei não é mais um fardo, mas uma expressão de amor e alegria.

Deuteronômio 30.15-20 é uma poderosa exposição da Lei, que revela nosso pecado e a nossa incapacidade de ter vida por nós mesmos. Ele nos aponta para a necessidade de um salvador e nos leva ao Evangelho, que oferece a vida e o bem como um dom gratuito, recebido somente pela fé em Jesus Cristo. Amém

Edson Ronaldo Tressmann

Entre lógicas: do mundo e do Reino de Deus! (Lc 16.1-15)

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