23/06/13 – 5º Domingo após
Pentecostes
Sl 138; Gn 50. 15 - 21;
Rm 12. 14 - 21; Lc 6. 36 - 42
Tema: “intentastes o mal
contra mim; porém Deus o tornou em bem” (Gn 50.20).
Numa biblioteca conseguimos muitas
histórias. Histórias que ensinam, motivam e consolam. Como IELB, fazemos parte
de uma biblioteca. Afinal, 109 anos, nos dão critérios para sermos uma história
que ensina, motiva e consola. Nossa história está registrada em dois belos
livros, cujo titulo é: Grão de Mostarda, Volumes I e II.
E
nessa história que ensina, motiva e consola, destacamos uma breve parcela da
mesma, para podermos concluir assim como José diante dos seus irmãos: “... intentastes o
mal contra mim; porém Deus o tornou em bem, para fazer, como vedes agora, que
se conserve a vida de muita gente em vida” (Gn 50.20)
A
história da IELB é recheada de testemunho de vidas transformadas pelo Evangelho.
E essa transformação operada pelo Espírito Santo, ao concluirmos nosso breve
relato histórico nos impulsionará a confessar, e não diante de 11 pessoas, mas
de todo o Brasil que mesmo diante das coisas ruins, Deus nos preservou para que a
vida continue sendo comunicada. E essa comunicação é que nos manteve
firmes diante dos acontecimentos em terras brasileiras.
Cerca
de 3,8 milhões de estrangeiros ingressaram no Brasil entre os anos de 1887 e
1930. Desses, 72% entre 1887 e 1914, ano em que houve uma redução das entradas
em função da I Guerra mundial. Numericamente, na soma total da imigração -
contabilizando a retomada do fluxo com o fim da I Guerra - os alemães foi o
quarto maior grupo. Muito aquém, portanto, dos italianos (1.513.151),
portugueses (1.462.117) e espanhóis (598.802). Os teuto-brasileiros somaram
cerca de 250 mil indivíduos. Dentre estes, o número dos imigrantes e seus
descendentes que se filiaram ao Distrito Brasileiro do Sínodo de Missouri foi
estimado, no ano de 1924, em 21.225 pessoas, espalhadas em 116 capelas
pertencentes a 35 paróquias.
É
preciso ressaltar que a ala do luteranismo que hoje constitui a Igreja
Evangélica Luterana do Brasil, IELB, tem sua origem na atuação de missionários
norte-americanos, mas que desde o início do século XX sempre de novo
enfatizaram que sua atuação nunca visou especificamente à população de origem
alemã, chegando, inclusive, a ter comunidades constituídas exclusivamente por
afro-brasileiros. A verdade é que o luteranismo, como um todo, continua a
caracterizar-se, até hoje, por membros de sobrenome alemão. Mas, diante disso o historiador René Gertz
diz que “deve-se chamar a atenção
para o fato de que para a opinião pública brasileira, e também para muitos
cientistas sociais, as comunidades de origem alemã em geral, e sobretudo as
luteranas, se caracterizariam pelo profundo isolamento.”
Em
uma pesquisa realizada no início dos anos 1960, sob orientação de Darcy
Ribeiro, a respeito de uma comunidade rural no interior de Santa Catarina,
lê-se: “a Comunidade Evangélica,
sempre reunindo um grupo de origem alemã, constitui um dos fatores que mais se
opõem à assimilação dos seus elementos à sociedade brasileira.”
Mesmo
que não fosse intencional, buscava-se levar o evangelho aos imigrantes alemães
e seus descendentes “teuto-brasileiros.”
Para
a direção do Sínodo de Missouri, esta ajuda não era apenas um dever de amor
cristão, mas uma responsabilidade étnica. Comentava-se que ‘são alemães, são luteranos, cabe-nos ajudá-los’ (Steyer,
1999). No Brasil, os missionários não precisavam aprender uma língua estranha,
que iria requerer grande esforço, pois podiam logo transmitir a palavra de Deus
na língua materna alemã. Por outro lado, não precisavam procurar famílias
alemãs isoladas e dispersas, pois centenas e milhares se encontram concentradas
em vilas e cidades.
Nossa identificação, e isso faz parte do
nosso DNA constituído, está atrelado a um grupo de imigrantes europeus. Grupo esse
que está em extinção no Brasil, pois hoje, a sociedade brasileira está tomando
forma, sendo uma miscigenação entre brancos, negros e índios. Estamos
inseridos, depois de 109 anos num novo paradigma: “Uma Igreja de origem Europeia, atuante entre
seus imigrantes europeus, buscando abrasileirar-se.”
E essa marca, “Igreja de Alemão” é que levou a
grandes problemas para a nossa igreja, IELB. Por ser formada de protestantes alemães, era tida pelo
governo, como um espião alemão em terras americanas e brasileiras. Esse fato
triste e lamentável, devido à confusão, levou o sínodo de Missouri em solo
norte americano se nacionalizar. E tendo, nossos irmãos norte-americanos,
enfrentado esse processo antes de nós IELB, muito nos auxiliou nos passos a
seguir diante da germanidade ante a guerra mundial. Conforme documentos da Convenção Nacional da IELB – 24 a 31 de janeiro de 1937 –
Porto Alegre/RS vemos que “nossa Igreja
reconhece a existência de etnia e o cultivo de coisas pertinentes ao povo
(manutenção do idioma e costumes). Tais são assuntos da vida dos cidadãos, e
portanto, atribuições do arranjo da vida em sociedade (governo, partido,
associação, etc)”. E nesse meio aconteceu a nossa identificação. Mas
é triste, devido à confusão, ainda sermos conhecidos como uma “Igreja de alemães
para alemães.”
A
IELB foi muito perseguida no Período da Segunda Guerra Mundial. E essa
perseguição se mostrou pela proibição do uso da língua alemã nos cultos e
atividades da Igreja. Pastores foram presos. Literatura confiscada. Igrejas
foram saqueadas (Igreja Queimada) Cerrito/RS. Um período caracterizado
magistralmente pelas palavras do secretário executivo das Missões da LCMS
“Estes foram
dias de perigo e amargo sofrimento. Nunca, na história do Sínodo de Missouri,
nossos cristãos, em algum lugar, sofreram tanta ameaça, antagonismo,
animosidade, perseguição às nossas congregações, pastores, irmãos em Cristo
como está acontecendo no Brasil”
Até
o período inicial da Primeira Guerra, a vida dos sínodos luterano-alemães no
Brasil não fora alterada substancialmente. Também porque o Brasil na época
desenvolvia políticas de neutralidade em relação ao conflito internacional. Não
obstante, os recorrentes posicionamentos das comunidades alemãs em favor da
terra mãe em situações belicosas, o envio de verbas e auxílio à Alemanha, as
intenções imperialistas do Kaiser, bem como o uso contínuo e generalizado do
idioma alemão (em igrejas e escolas) e o cultivo das tradições alemãs, iam
criando certo espírito de animosidade na opinião pública contra os
teuto-imigrantes.
Como
era de se esperar diante de tal quadro, aquela situação de relativa
estabilidade viria a se alterar a partir de 1917, com a ruptura das relações
diplomáticas com o Reich e a entrada brasileira na Guerra junto aos aliados. No
final do mesmo ano as represálias à comunidade teuto-brasileira vieram à tona: as escolas alemãs foram fechadas progressivamente e foi proibida a
utilização do idioma alemão.
Em
meio a tais represálias, o Mensageiro Cristão de 15 de abril de 1918 trouxe,
sob o título "Paz seja convosco",
as palavras do pastor Louis Rehfeldt, afirmando que ainda que o mundo espere o
restabelecimento da paz, essa "utopia dos
visionários", a paz universal, nunca aconteceria. O pastor
Rehfeldt, então professor do Seminário Concórdia e redator do periódico,
conclui asseverando que a paz de Cristo, que excede todo o humano entendimento,
essa paz o mundo não conhece (Mensageiro Cristão, nº 6: 21), e nem queria
conhecer. E diante dessa constatação podemos louvar a Deus e
entender que nos tem preservado para que essa paz, a vida seja comunicada.
A
ideia subjacente de "paz" religiosa, ao mesmo tempo oposta e
alternativa ao "mundo", traz consigo a semente da espiritualidade
confessional luterano missouriana. Em sua concepção, a paz completa e
verdadeira somente poderia ser alcançada através da fé em Cristo, pelo qual se
tem a salvação. Essa paz o "mundo" não pode trazer. Somente o pode a
Escritura corretamente interpretada, palavra inspirada por Deus. E essa
é a missão e o desafio da IELB. Ser uma Igreja Confessional que atinge as
pessoas, tanto com palavras como em ação.
Quando
caíram as sombras da desconfiança por sobre o "perigoso" germanismo
brasileiro, com a sanção governamental da proibição do idioma alemão, o Sínodo
de Missouri se viu nivelado em meio aos demais grupos de imigrantes e, nesse
contexto, Johannes Kunstmann achou necessário reafirmar, em 31 de outubro (data
da comemoração da Reforma Luterana), o que era em sua concepção confessional o
verdadeiro luteranismo:
Nesses tempos, quando o luteranismo, em países de fala
inglesa, é confundido com germanismo, e em nosso país, ao menos por parte da
Igreja Evangélica alemã unionista, com americanismo, vale a pena lembrar o que
realmente significa luteranismo. (…) Luteranismo, como tal, de nenhum modo
significa germanismo ou americanismo. (...) Luteranismo não tem, em absoluto,
nada a ver com política ou "Kultur", ou com zonas de interesse, ou
com qualquer outro assunto deste mundo (...) O luteranismo sustenta o princípio
'Sola Scriptura'. Ele reivindica que a Bíblia, por ser a palavra inspirada de
Deus, é a única fonte e norma de todas as doutrinas de fé e moral. (...) afirma
o 'Sola Gratia'. Professa Cristo, e ele crucificado, ensinando que não há outro
nome pelo qual o homem possa ser salvo (...) e que, portanto, o homem não é
justificado por suas obras, mas pela graça, por causa de Cristo (...)
Luteranismo é (…) o verdadeiro campeão da liberdade diante do papa e do clero,
da liberdade religiosa da consciência, da liberdade da igreja e dos indivíduos,
somente ordenando os luteranos a Cristo Jesus, seu único mestre (...) (Suplemento para leitores em inglês,
Mensageiro Luterano, nº 19, 31/10/1918).
Essa
afirmação é reveladora das transformações para uma igreja brasileira e nos
ajuda nesse ponto em que queremos mostrar que nossa fidelidade não é racial, ou
de origem eclesiástica, mas antes de tudo e acima de tudo, confessionalidade bíblica.
Na
IELB a ultima palavra é do Evangelho. Por isso “evangélica.” Evangelho
esse trazido de volta por Lutero através da exegese bíblica. E essa volta a
exegese bíblica para que a vida continue sendo comunicado é urgente e
fundamental, pois vivemos dias de eixegese.
Como
Igreja Cristã, sabemos que as perseguições e tribulações fazem parte da Igreja,
assim como dito ao apóstolo João de que “...seu estômago ficará amargo,...”
(Ap 10. 10). Mas, entre as tribulações, reconhecemos que o Evangelho traz
alegrias incontáveis, como anunciado ao apóstolo João: “...mas sua boca será doce como mel”
(Ap 10.10).
Numa
biblioteca conseguimos muitas histórias. Histórias que ensinam, motivam e
consolam. Uma dessas biografias é a de José, apresentada nas primeiras páginas
da Bíblia, no livro de Gênesis.
Ao
falar um pouco da biografia desse homem, meu desejo é que cada ouvinte, ou
leitor, tente identificar sua própria vida nesse personagem e que possa também
reconhecer e confessar: “intentastes o mal contra mim; porém Deus o tornou em
bem” (Gn 50.20).
A
biografia de José está registrada nos capítulos 35 – 50 de Gênesis. Uma
biografia linda, com um final surpreendente. Uma biografia que ensina, motiva e
consola.
Deixe-me
resumir essa biografia.
Um
jovem amado pelo seu pai. Um jovem sonhador. Um jovem com um dom
extraordinário: interpretava sonhos.
Tinha 11 irmãos. E eles, movidos pelo ciúme, pela inveja e raiva, agiram
violentamente contra José.
José
foi mal tratado. Vendido aos ismaelitas, depois a Potifar. Foi caluniado, preso.
E a grande
lição de José, foi que sempre viveu um dia após o outro, esperando no Senhor.
Depois
de muitos anos, quando grande fome se abateu sobre o mundo, José, agora
governador do Egito, recebeu a visita dos seus irmãos que vieram atrás de
alimento. Uma ótima oportunidade para vingança. Mas, José, soube lidar com seus
irmãos. Ele disse, assim como nós, IELB, depois de tantas coisas ruins que nos
aconteceram, podemos dizer: “É verdade que vocês planejaram aquela maldade contra mim, mas
Deus mudou o mal em bem para fazer o que
hoje estamos vendo, isto é, salvar a vida de muita gente” (Gn
50.20).
Com
a biografia de José aprendemos o julgamento está nas mãos de Deus. E esse
aprendizado recebemos de Jesus: “Não julguem os outros para vocês não serem julgados por
Deus” (Mt 7.1). Apesar de ter recebido violência, injustiça, inveja,
ódio. José ensina que a retribuição precisa ser de amor, paciência e perdão.
Jesus
também não foi recebido pelos seus, foi insultado, tratado com violência, mas, na
cruz ensinou: “Pai,
perdoa esta gente! Eles não sabem o que estão fazendo” (Lc 23.34).
Sofreu por nós, morreu por nós, venceu por nós. E essa Vida a IELB nesses 109 anos
tem comunicado e continuará comunicando com a graça de Deus.
Que
a biografia de José tenha nos ensinado, motivado e consolado. Afinal, nossa
biografia, assim como a de José iniciou-se (na circuncisão) no batismo. E como
filhos de Deus pelo perdão recebido por Deus somos capacitados a viver uma vida
de perdão, ensino, motivação e consolo. E que com as “nossas forças aumentadas” (Sl
138) possamos confessar assim como José: “intentastes o mal contra mim; porém Deus o tornou em
bem” (Gn 50.20). Amém!
Pr Edson Ronaldo Tressmann
cristo_para_todos@hotmail.com
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